terça-feira, 21 de abril de 2015

Apenas pensamentos.




São Paulo, 19 de dezembro de 2010



Desde o dia do encontro com o Moacir, Clara vem se mostrando muito diferente. É como se algo a tivesse irritado profundamente. Pensei que ela já soubesse de sua origem afinal de contas foi ela mesma quem mencionou o nome de Lilith  pela primeira vez. Disse inclusive, ter feito várias buscas e pesquisas. Então porque esse comportamento? Estou começando a achar que alguma coisa não bate nisso tudo. Um espelho se quebrou e a imagem que vejo agora é muito diferente da que eu cultivei por algum tempo.
Mesmo agora, ela não está, saiu sem sequer me avisar. Já não quer minha companhia e, sinceramente, agradeço por isso. Também tenho preferido estar sozinho, buscando minha própria forma e essência, minha existência não pode ser apenas o acordar, caçar e voltar a dormir para, no dia seguinte, repetir a mesma coisa. Que importa estar no tal “topo da cadeia alimentar” se tudo se resume a isso: caçar.
Resolvi que vou procurar pelos outros e que se danem todas as recomendações de não fazê-lo. Porque me esconder? Não sou um rato para ficar me esgueirando pelos becos, isso é ridículo.
Ontem, quando saí para me alimentar, senti que me observavam, pude identificar uma presença poderosa mas não consegui encontrar a pessoa. Não imaginam como é frustrante ter habilidades e não saber como usa-las. Ter um “mestre” e não receber dele nada mais do que dicas de como alimentar-se melhor e quais os tipos de sangue mais agradáveis.
Tenho feito algumas descobertas interessantes, comprovando que algumas lendas, de fato, tem sentido. Descobri que, mesmo tendo um estômago morto, eu posso me alimentar para dar à minha interpretação de vida um tom mais convincente. A comida em si não tem gosto nenhum, perdemos o paladar, meu organismo não está totalmente morto. Não entrei em necrose, meus órgãos ainda funcionam mas de uma foma muito mais lenta. É como se eu tivesse me transformado, do dia para a noite, em um hindu com técnicas de catatonia avançada.
Um outro ponto que anda me incomodando bastante. Não estou a fim de passar o resto da eternidade neste Mausoléu. Vendo o apartamento do Moa, senti vontade de ter um lugar mais confortável para viver. Sinto falta do meu computador, do meu console, dos meus jogos e dos meus livros. Não acho que para ser um vampiro eu tenha que abdicar destes prazeres. Decidi que vou procurar um outro lugar. Se a Clara quiser vir, ótimo, se não quiser, terei de ir sozinho.
Engraçado como as coisas mudam em tão pouco tempo. Outro dia mesmo, eu era apenas um cara apaixonado, capaz de fazer qualquer coisa pela mulher dos meus sonhos..mas isso me parece algo muito distante agora. Acho que nossos sentimentos mudam um bocado depois da transformação. Como se a trava do “politicamente correto” ou do comodismo já não existissem mais. Vampiros são humanos sem máscaras sociais, apesar de usarmos muitas de acordo com nossa conveniência.


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